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Em evento do CNMP, promotora baiana frisa importância do olhar interseccional para redução das desigualdades
O racismo institucional e a atuação do Ministério Público em prol da igualdade racial foram abordados pela promotora de Justiça baiana Lívia Vaz na tarde de hoje, dia 11, durante palestra no ‘I Congresso do Ministério Público Brasileiro’, promovido pelo Conselho Nacional do MP (CNMP). Ela abordou as temáticas a partir de uma perspectiva interseccional e frisou que é preciso garantir amplitude a esse olhar, observando a relação do racismo com práticas como machismo, homofobia, elitismo, entre outras. “Essa visão interseccional é urgente para que o MP possa cumprir com a sua missão constitucional de promover igualdade de direitos”, afirmou. Lívia Vaz pontuou ainda que muitos avanços são necessários e que é preciso ultrapassar o discurso, atingindo a prática na ponta, para se promover a igualdade racial no Sistema de Justiça.
A promotora de Justiça iniciou a palestra com a frase da escritora Grada Kilomba, que diz: ‘Uma mulher negra diz que ela é uma mulher negra. Uma mulher branca diz que ela é uma mulher. Um homem branco diz que é uma pessoa”. O que se percebe, afirmou Lívia, é que a mulher branca não se racializa, apenas se apresenta em gênero. Já o homem branco se diz a pessoa porque é padrão daquilo que é ser sujeito universal. Ela acredita que, na prática, essa questão da identidade pode trazer um peso e que “o Sistema de Justiça precisa enxergar essas identidades, vicissitudes e vulnerabilidades para que as pessoas realmente consigam acessar os direitos fundamentais”. Quanto à figura do sujeito universal, Lívia Vaz destacou que é preciso discuti-la, pois não atende igualmente a todos numa sociedade racista, machista, classista e patriarcal. “Uma mulher negra, não sendo nem homem nem mulher, é o outro do outro”, concluiu, citando o pensamento de Grada Kilomba.
A partir desse olhar, Lívia Vaz apresentou dados, ressaltando que as mulheres negras ainda recebem a menor renda mensal no país. Reforçou também que a raça é fator determinante das desigualdades e informou que uma pesquisa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), realizada em 2017, apontou que pessoas negras vivem menos do que as brancas neste país. “O fator raça é central, determina o tempo de vida de alguém no Brasil”, alertou a promotora. Ela apresentou o Atlas da Violência 2020, que contabilizou 57.956 homicídios, sendo que 75,7% das vítimas eram negras. O atlas indicou ainda que 68% das vítimas de feminicídio eram negras, sendo que este crime aumentou 12,4% entre os anos de 2008 a 2018 com relação às mulheres negras e teve redução de 11,7% quanto às mulheres brancas.
Ao abordar o racismo institucional, a promotora de Justiça lembrou que ele agrega conduta que inferioriza um grupo em benefício do outro e que o Sistema de Justiça tem que pensar a sua atuação, pois continua reproduzindo a cultura de uma sociedade essencialmente racista. Existem pouquíssimos negros integrando a estrutura desse Sistema, afirmou Lívia, ressaltando que as instituições precisam espelhar a diversidade étnico-racial do seu povo para que a atuação se aproxime, cada vez mais, daquilo que ela precisa ser. Para a promotora de Justiça, há uma série de necessidades e avanços quando se fala em atuação do MP com relação à igualdade racial, a Instituição sequer conhece a sua realidade, pois não tem dados quanto a sua composição racial. Lívia finalizou frisando que não se pode falar em democracia quando 56% da população não têm acesso a direitos que deveriam lhe ser assegurados, quando essas pessoas não estão nos cargos de liderança e poder.